Não conto onde está a ilha desconhecida de José Saramago

Deneval Siqueira de Azevedo Filho

Resumo


Saramago, de maneira engenhosa, mostra, em O Conto da Ilha Desconhecida a figura do monarca como emblemática. Os obséquios eram bem vindos, enquanto as petições não eram resolvidas, eram sim postergadas e posteriormente decididas, a depender do estado de espírito da mulher da limpeza. A burocracia nos serviços sublinha um governo distante de seu maior objetivo, promover o bem estar do povo. O repúdio do rei salta aos olhos quando evita aproximar-se do homem. Uma realidade próxima do absolutismo monarca. O rei teme ao homem, ao que possivelmente ouviria como crítica, por isso, barra seu contato com a voz do povo, como um instrumento que poderia proporcionar transformação social, ainda que veiculado primeiro ao plano pessoal e posteriormente com uma inclinação perceptível ao coletivo. A narrativa de Saramago está sempre em busca de uma conscientização do leitor. Como intelectual engajado nos problemas e tensões políticas de Portugal, ele conduz a problemática de uma historicidade local, em seus movimentos e contingências, investigando e recriando situações que questionam as ansiedades e esperanças humanas. Trabalhando os vários conceitos de Teoria e Política da Ironia (Hutcheon), este trabalho navega por fragmentos de uma parábola aparentemente simples, mas que se assemelha às parábolas contadas por Jesus Cristo aos seus discípulos com o objetivo de lhes fazer pensar. Sentimo-nos discípulos ao lê-lo. Pode ser lido como a parábola do sonho realizado, isto é, como um canto de otimismo em que a vontade ou a obstinação fazem a fantasia ancorar em porto seguro. Porém, em se tratando de José Saramago, temos que desconfiar. É um livro que nos leva a “navegar” para além do real, de uma forma simplista e conseguida. Antes, entretanto, ela é submetida a uma série de embates com o status quo, com o estado consolidado das coisas, como se da resistência às adversidades viesse o mérito e do mérito nascesse o direito à concretização. Entre desejar um barco e tê-lo pronto para partir, o viajante vai de certo modo alterando a ideia que faz de uma ilha desconhecida e de como alcançá-la, e essa flexibilidade com certeza o torna mais apto a obter o que sonhou. A busca do autor, que é universal, inicia-se na direção a que o ser humano se sente impelido, mesmo ciente de que talvez não chegue ao fim.


Palavras-chave


José Saramago, O Conto da Ilha desconhecida, parábola, Ironia, Status quo.

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